Que difícil é falar sobre um dia que tanto marca. Difícil, porque colocar em palavras o que nem as palavras são capazes de explicar é meio que tentar objetificar o que é transcendental. Mas numa busca para tal, eu me arrisco.
Digo que o dia 20 de abril de 2022 foi, no mínimo, mágico; fora do calendário, talvez. Uma data vivenciada por todos, mas, sobretudo, por mim, Luiza Gurgel, no planeta Arte, onde ela é palavra de ordem e o tempo caminha em busca da mesma. Eu lançava o meu primeiro livro: “Nosso Chão – A Terra Que Brota Cultura”. Nesta quinta-feira, o #TBTEMPO, do Reticências Culturais.
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Se me permitem, debruçarei nestas palavras o sentimento íntimo de uma inquieta artista, quebrando quaisquer barreiras de distanciamento escritora-leitor; jornalista-internauta; artista-público. Aqui, falarei para você, de minha alma.
Mais um dia, menos um, na vida de uma artista. Mais um dia de labuta. Mais um dia de espetáculo, fazendo o chão sob as minhas pegadas de palco. “Mato meu leão todo dia pra não ver o meu canto calado morrer”, como diz Khrystal. É mais ou menos por aí. Só que o “canto”, por aqui, tem formato de literatura.
Era uma quarta-feira. Meio da semana. Dia do lançamento de um livro. Ou melhor, da adaptação de um cordel. O meu. “Nosso Chão – A Terra Que Brota Cultura”, o seu nome.
Existia expectativa ali naquela estreia. O correr do tempo não estava dos mais favoráveis. Entre trabalho e responsabilidades, ele se espremia para existir. Mas sempre certo de que, no final do dia, início da noite, aquele livro bonito estaria sendo lançado.
Uma particularidade, no mínimo curiosa, é de que naquele mesmo dia, por volta da hora do almoço, cortando um tomate, quase corto o meu dedo, acredita? Mas nem isso iria atrapalhar o que explodia no meu coração naquele momento. Encaixando a caneta aqui, apertando o dedo ali, ensaiei um “Abraços, Luiza Gurgel”. Deu certo.
“Isso aqui está sendo um grande abraço para ela e eu senti a mesma coisa”.
Beatriz Gurgel, cantora e irmã de Luiza.
Ainda não sei até hoje como consegui alcançar às seis horas da noite. Sufoco para aguentar tanta emoção. Muita coisa passava na minha cabeça. Medo. Insegurança. Felicidade. Orgulho. Prazer. Angústia. E tantos outros sentimentos até hoje tento decifrar a presença. É… parece ápices de emoção e expectativa nos causam esse estardalhaço de sensações, não é mesmo?
Diante disso, fiz daquele caldeirão um bom chá de boldo e respirei. Deixei Fluir. E posso dizer: foi lindo. Não para os outros, não pelos outros, mas para mim. O sentimento que me causa hoje ao lembrar daquele momento já me basta.
A minha vontade em falar sobre a arte e a cultura de um lugar, principalmente, de onde eu vivo, existe antes mesmo d’eu ter noção dessa vontade. Tudo aconteceu de forma orgânica, sem eu notar o que já fazia. Um dia escrevi que é sangue de meu bisavô Deífilo em minhas veias. Talvez, sim. Ou talvez apenas uma artista que vibra com outres artistas.
Rememorando as minhas lembranças a partir deste recorte, consigo visitar diversos episódios, como o documentário sobre o Grupo de Teatro da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (GRUTUM); o documentário que estou produzindo acerca a minha bisavó, Glorinha Oliveira – que deve sair no final deste ano; ou até mesmo esta página onde agora escrevo. O Reticências Culturais é um grande acervo de armazenamento artístico da cidade de Mossoró.
Sem sair das minhas próprias linhas, surge a possibilidade de escrever um cordel sobre a história da arte e da cultura da Capital do Oeste Potiguar. Comecei no papel. Escrevi algumas páginas, mas logo vi que seriam insuficientes. Migrei para o computador, onde finalizei-o um ano depois.
Conversei com historiadores, sentei para tomar um café com bailarinos de uma outras épocas, liguei para músicos de diversas esferas, deixei algumas mensagens em conversas de whatsapp de diversos artistas da cidade. Pedi ajuda. Ouvi. Aprendi com quem tinha o que ensinar. Absorvi histórias que, de uma forma ou de outra, perpassam a fazedora de arte que sou hoje.
Como quem constrói uma biblioteca, tijolo por tijolo, eu estruturava aquele cordel. Cada página, uma nova parede que se levantava nessa faculdade que é a literatura. A rima veio para divertir, para trazer leveza a esse ato tão bonito da cidade e da população. E assim, ele foi se fazendo. Minha mão e mente já funcionavam para aquela obra literária que se construía naquele período para viver do infinito onde a arte mora.
“Luiza está tatuando na gente com palavras aquilo que ela acredita. Para mim, é importantíssimo quando uma jovem escreve para dizer que existe a arte e a cultura na cidade”.
Tony Silva, atriz.
No dia do lançamento, contei com parceiros e parcerias únicas. O SESC Mossoró abraçou a ideia, cedendo o espaço para a realização do mesmo; a Padaria Frota Gourmet entrou no projeto doando quitutes deliciosos para tornar a ocasião ainda mais especial; a minha cunhada Lourrany Sá e os amigos Marcelo Amarelo e Damásio Costa, que, disponibilizaram tempo e objetos para compor a decoração; a Editora Queima-Bucha, na pessoa de Gustavo Luz; o meu amigo e grande artista Gabriel Azevedo, que fez a melhor ilustração que “Nosso Chão” poderia ter; o meu amigo e grande profissional Fábio Paiva e a sua companheira com todas as fotografias incríveis e inesperadas; a banda Coisaluz, que fazia parte da mesma programação que eu, e fez um show lindo durante o lançamento; o meu companheiro de vida, Plínio Sá, que tanto faz diariamente; a minha mãe e a minha irmã, que sempre se fazem presente; e muitos outros e outras que foram imprescindíveis neste processo.
Sem que eu me desse conta do que acontecia, Plínio, como integrante também do Reticências, tomou a frente para registrar aquele lançamento. Sem perspectivas finais, sem pretensões maiores. Apenas a intuição de que aquele abraço deveria ser registrado. E foi. Está. Para sempre. Plínio editou o material e me deu de presente a materialização de um dos momentos mais importantes da minha vida.
A videorreportagem começa com uma fala que nem eu sequer lembrava que tinha dito: “[as crianças e adolescentes] são responsáveis pelo nosso futuro [e] precisam saber que chão é esse que elas pisam para conhecer, para saber quem ela precisam entender que precisou existir para que hoje ela possa existir também enquanto artista”. Falaria e repetiria quantas vezes fosse preciso. É isto.
O cordel “Nosso Chão – A Terra Que Brota Cultura” nasce também para isso, além, também, de registrar esse grande episódio, que nunca vai deixar de existir. Em outro momento, eu digo, no especial, que “quando a gente conhece esse chão, quando a gente conhece esse passado, passa a ter um significado diferente […] tem uma responsabilidade maior, e assim, a gente vai resistindo existindo”. Cada uma e cada um de nós.
Tento, tento pôr em palavras o que existe no sentir. Mais uma vez, sem sucesso, mas tentando transcrever o que aquele lançamento me causou. Foi verdadeiramente um abraço. Daqueles que passam os dias e nunca acabam.
Aos e às mossoroenses, digo: “ao mesmo tempo em que estou sendo semente, nós também somos flores que estamos sendo brotadas de sementes passadas. É sempre essa simbiose de ser floresta e de ser semente, e assim a gente vai se construindo, a gente vai se florescendo, a gente vai se adaptando para estar sempre fértil para que novas pessoas possam vir”.
Aos e às que estavam lá naquele 20 de abril de 2022, minha eterna e mais sincera gratidão.
Confira, abaixo, como foi o lançamento do cordel “Nosso Chão – A Terra Que Brota Cultura”, de Luiza Gurgel:
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