O que se colhe no caminho? Frutos? Espinhos? Flores? Sorrisos? Para este grupo, “os fins justificam os meios”. Ou podemos dizer que os meios justificam os fins, já que o processo, suado e prazeroso, lhe rendeu mais de 15 prêmios num festival de dança. Independentemente de qualquer empecilho, são mais de 15 vezes “sim”, mais de 15 reafirmações de que o caminho é por ali. É valorização e a emoção de um momento abrilhantado pela dança.
Tudo começou no dia 23 de junho, quando o Theatro José de Alencar, em Fortaleza/CE, abriu as portas para a 22ª edição do Festival Internacional de Dança de Fortaleza, o FENDAFOR. Daqui de Mossoró, cerca de 30 bailarinas e bailarinos, entre crianças e adolescentes, saíram em direção ao nosso estado vizinho, cobertos pela ansiedade de pisar no palco de um dos teatros mais bonitos do Brasil. (Acreditem, eu sei o que é esse sentimento).
Na bagagem, grampos de cabelo, polainas, sapatilhas (para alguns), tênis (para outros), um spray de Gelol, e muitos passos sequenciados guardados, com cuidado, na memória. A cidade de Fortaleza se resume, temporariamente, ao José de Alencar. As ruas viram os corredores; a população se resume a colegas de grupo ou competidores, mas, antes de tudo, bailarines; e as leis são constituídas – pelo menos, por alguns dias – para a dança. Pensadas para e partir dela. No mundo de quem vive essa arte, a gente pode sonhar um sonho vivo.
Voltando a Mossoró. Quem saía daqui naquele final de junho, início de julho, eram os integrantes do Espaço Artístico Natália Negreiros, uma academia de dança da Capital da Cultura Potiguar. Essa foi a primeira vez que a escola participou do FENDAFOR. Antes disso, o EANN foi para a seletiva de um outro festival, o Passo de Arte, também em Fortaleza, em 2019, ano em que o Espaço foi aberto. De lá, eles levaram dois prêmios, ambos 3º lugares. Logo em seguida, veio a pandemia da Covid-19 e as atividades foram paralisadas.
Anos depois, após a diminuição nos números de contaminação pela doença e com a possibilidade das vacinas, a escola retornou aos encontros presenciais transbordando vontade de dançar. E foi aí que o Festival Internacional de Dança de Fortaleza tornou-se uma realidade.
Dessa vez, a bagagem voltou mais carregada: foram 3 coreografias com a medalha de 3º lugar; 4 apresentações com o 2º lugar; e 9, levando o tão sonhado 1º lugar. Além disso, o núcleo ainda foi premiado como “Melhor Grupo do Festival”; “Melhor Coreógrafa”, a Natália Negreiros; e “Melhor Bailarino”, a Felipe Luiz. Das 17 obras que o Espaço Artístico levou, apenas uma não recebeu premiação, mas, segundo a diretora do grupo, foi presenteada com uma boa nota e acabou ficando em 4º lugar de uma média de vinte trabalhos na categoria.
Ao todo, foram 16 medalhas e 3 troféus. Bonito de se ver, né não? O pódio, na real, é o do reconhecimento. A coreógrafa Natália Negreiros diz que todas as coreografias seguem o princípio do EANN: comunicar, de modo a trazer à tona assuntos sensíveis e relevantes à sociedade, visando sensibilizar o público, através da arte, a pensar temas que precisam ser falados.
Os prêmios trouxeram outras consequências. Juntamente às medalhas, eles receberam convites e isenções de inscrição em outros cinco festivais nacionais e dois internacionais, sendo um na Argentina e outro na Itália, todos na área da dança.
“Foram muitas alegrias e respostas para continuar com o nosso trabalho”, descreve a coreógrafa Natália Negreiros.
Eu tive a oportunidade de conversar com uma das bailarinas do Espaço Artístico e dona de uma das medalhas de 1º lugar do grupo. Paula Martins dançou em “Plumas em Seca”, coreografia feita por Cid Neto; “Hiato”, coreografada pela diretora do núcleo mossoroense; “No Pain No Gain” e “We Can Do It”, ambos idealizados por Felipe Luiz. As cores foram, respectivamente, ouro, ouro, bronze e prata.
Para Paula Martins, os resultados aumentaram ainda mais a vontade da bailarina de seguir e ser ainda melhor naquilo que ela mais ama: dançar. Ela associa as tantas premiações no FENDAFOR ao incentivo que, às vezes, é tudo o que a gente precisa para continuar. No entanto, Paulinha, como é conhecida entre a turma, diz que a sensação que se tem quando sua arte é vista e reconhecida é maior do que a própria medalha. E, pelo jeito, foi o que aconteceu.
A bailarina fala ainda sobre a importância de estar representando Mossoró, cidade onde nasceu e cresceu. E sempre dançando, desde criança. Por isso, para ela, o sentimento de orgulho é grande. É muito. Além da sensação de dever cumprido, até porque, “nem sempre se tem tantas oportunidades para isso”.
Foi um processo de preparação longo e cansativo. Ensaios que tomavam conta da semana e do final de semana também. O Espaço Artístico Natália Negreiros virou a segunda casa para muita gente. Para a bailarina do solo “We Can Do It”, o início é sempre mais difícil, pois é o momento de adaptação e montagem, e, segundo ela, dependendo do grau de complexidade e habilidade, acaba sendo um desafio para o bailarino.
“São muitas batalhas pessoais para chegar no mindset de que você é capaz, sabe? Principalmente vivendo um processo de se entender como artista”, desabafou a bailarina premiada. “Mindset” é um termo ligado à forma como lidamos com a vida e com a nossa mentalidade, segundo o Instituto Brasileiro de Neurodesenvolvimento. E como não? Viver em sociedade, sobretudo no mundo da arte, é lidar constantemente com o dilema do ser ou não ser, do poder ou não, do “ter condição para”.
No caso de Paulinha, um dos motivos que fizeram o teu coração palpitar mais rápido foi o desafio de dançar sozinha no palco de um grande teatro depois de tanto tempo sem viver um momento assim. A insegurança deu lugar a uma medalha de ouro. Além disso, também foi dificultoso conciliar o último ano de faculdade com o empenho nos ensaios. Foi pelo amor à dança, ela diz, que fez todo aquele esforço, e, assim, a abdicação de certos momentos foi transformada em uma recompensa maior.
“Ninguém conhecia a gente no dia em que chegamos. E depois de duas das dezessete apresentações, começaram a nos reconhecer, a parabenizar pelo nosso trabalho”: foi o que Natália Negreiros falou aos seus pupilos no 4º dia de Festival. De acordo com ela, o objetivo principal é espalhar a arte do grupo, diminuindo o sentido comercial das escolas de dança e aumentando o sentido artístico do negócio, que é o elo entre todes.
“O sentido de festivais para nossa escola se baseia na busca do conhecimento através dos cursos, nas sugestões de grandes nomes da dança ao assistirem nossos trabalhos e na troca maravilhosa com 12 estados diferentes do Brasil. Esse é o maior prêmio que pudemos obter”.
Natália Negreiros, coreógrafa e diretora do EANN.
Agora, o próximo passo é a preparação para o núcleo participar do Festival Livorno in Danza, na Itália. Eles e elas estão idealizando ações para ajudar na realização deste sonho. Paralelamente a isso, o Espaço está nos processos iniciais para o seu mais novo espetáculo, que em breve, estará divulgando as datas de apresentação.
Até lá, com a certeza de que, neste caminho, dedicação colhe esplendor, e arte colhe vida. Entre ensaios e mais ensaios, idas e vindas, mais dezesseis “sim’s” estampados na parede, sobre a estante, guiando viver e ser a dança.
CONFIRA ALGUMAS DAS COREOGRAFIAS
Veja mais coreografias no perfil de Instagram: @natalianegreiros_.
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